Era, no início, uma verruga quase invisível, deitada na pálpebra esquerda.
Chico foi crescendo, e a verruga tomou-lhe conta do rosto. Tornou-se uma coisa viva, consumiu-lhe o olho, repuxou seus lábios, presenteando-o com uma espécie de sorriso sarcástico, permanente, agônico. Atingiu-lhe, também, a testa e parte do couro cabeludo, e, depois que não tinha mais o que lhe franzir no rosto, começou a rachar-se, fender-se como um solo afetado por um terremoto.
Nesse estágio evolutivo da chaga, contava Chico dezesseis anos de idade ― Evoluíra bem menos que a ferida, certamente. Ganhava os primeiros fios de barba a chaga. Nasceram, entre as fendas, grossos, pontudos, espinhentos, lavados, sempre, pelo pus que escorria como orvalho.
Quem sabe a barba incomodara a moléstia, pois foi nesse tempo que ela partira de vez o rosto de Chico. Dera-lhe bocas sem dentes por todo o lado esquerdo do rosto e, quando ele uivava de dor, todas elas se abriam, viscosas, purulentas, nauseantes. Compondo uma analogia bizarra à górgone que tinha serpente por cabelos . E morto, de boca fechada, elas continuavam abertas, num mutismo lúgubre, em consideração ao finado Francisco de Assis da Silva.
( Maurício Palmeira)
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