23 outubro 2015

SONETO DA HORA FINAL



Será assim, amiga: um certo dia
Estando nós a contemplar o poente
Sentiremos no rosto, de repente
O beijo leve de uma aragem fria.

Tu me olharás silenciosamente
E eu te olharei também, com nostalgia
E partiremos, tontos de poesia
Para a porta de treva aberta em frente.

Ao transpor as fronteiras do Segredo
Eu, calmo, te direi: – Não tenhas medo
E tu, tranquila, me dirás: – Sê forte.

E como dois antigos namorados
Noturnamente triste e enlaçados
Nós entraremos nos jardins da morte.


                             Vinícius de Moraes)

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DUAS ALMAS


















                                                      

Ó tu, que vens de longe, ó tu, que vens cansada,
Entra, e sob este teto encontrarás carinho:
Eu nunca fui amado, e vivo tão sozinho,
Vives sozinha sempre, e nunca foste amada...

A neve anda a branquear, lividamente, a estrada,
E a minha alcova tem a tepidez de um ninho.
Entra, ao menos até que as curvas do caminho
Se banhem na nascente da alvorada.

E amanhã quando a luz do sol dourar, radiosa,
Essa estrada sem fim, deserta, imensa e nua,
Podes partir de novo, ó nômade formosa!

Já não serei tão só, nem irás tão sozinha:
Há de ficar comigo uma saudade tua,
Hás de levar contigo uma saudade minha.



    (Alceu Wamosy)



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SUAVE CAMINHO



Assim... Ambos assim, no mesmo passo,
Iremos percorrendo a mesma estrada; 
Tu - no meu braço trêmulo amparada,
Eu - amparado no teu lindo braço. 

Ligados neste arrimo, embora escasso, 

Venceremos as urzes da jornada. 
E tu - te sentirás menos cansada, 
E eu - menos sentirei o meu cansaço. 

E, assim, ligados pelos bens supremos,

Que para mim o teu carinho trouxe,
Placidamente pela vida iremos, 

Calcando mágoas. Afastando espinhos.

Como se a escarpa desta vida fosse 
O mais suave de todos os caminho 

                        (Mário Pederneiras)

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FIM DA JORNADA!!