Muitos dizem que cada qual possui uma missão a ser realizada. Isto foi
algo em que nunca cri, muito menos naquela tarde.
Era inverno, como sempre em
São Joaquim. Completava quase um ano que poucas almas eram vistas nas
redondezas da Igreja Matriz, já que era ali que o sinistro acontecia. Sete mortes em
demasiado curto período de tempo e nem ao menos um suspeito encontrado. Nossa
cidade, tão alegre e frequentada, tornou-se sinônimo de desgraça. Nunca temi a
morte, pois a tive sempre como consolo; por tal razão continuava circulando sem
medo algum. Enquanto caminhava, perdido em meus pensamentos, dei-me conta de
onde estava: no local do último crime. O ar rarefeito, costumeiramente frio,
tornou-se cortante em minha face e rígido aos meus pulmões. Ao virar-me a fim de
partir, minhas trêmulas pernas traíram-me, precipitando-me a queda. No chão,
vi uns singelos óculos pretos, que trouxe pela mão para mais perto.
Por
instinto, ajustei-os próximos aos olhos. Um arrepio agônico trespassou-me a espinha; pude ver os
cinco minutos finais da mais recente vítima do assassino. O que me pareceu um
pesadelo tornou-se o inferno: pude ver o rosto do atirador, e este era, contra toda e qualquer probabilidade, meu próprio pai.
No caminho para casa, refleti sobre o homem que criou-me só - frio e calculista,
porém nunca cruel. Já em meu quarto, pensei sobre o que faria. Cogitei chamar a
polícia, mas quem acreditaria em um pivete de 16 anos? Escondi minha descoberta
por duas semanas, até que aquilo ocorreu novamente. Descobri uma força de revolta
descomunal. Busquei, sofregamente, evidências até encontrá-las, óbvias e
nítidas, na cômoda de meu pai; nela havia uma lista, na qual o único nome ainda
não riscado era o meu. Atônito, virei-me e, perturbadoramente, deparei-me com
meu pai, observando-me com sua pistola em mãos. Do porão, todas as manhãs,
ouvia as notícias sobre meu "desaparecimento", seguidas da vinda do
homem com minha refeição diária. Isto se seguiu até o dia de meu suicídio.
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