Ninguém sabia donde viera a estranha ave.
Talvez o último ciclone a arrebatasse
de incógnita ilha ou de algum golfo
ou nascesse das algas gigantescas do mar;
ou caísse de uma outra atmosfera,
ou de outro mundo ou de outro mistério.
Velhos homens do mar nunca a haviam visto nos gelos
nem nenhum andarilho a encontrara jamais:
era antropomorfa como um anjo e silenciosa
como qualquer poeta.
Talvez o último ciclone a arrebatasse
de incógnita ilha ou de algum golfo
ou nascesse das algas gigantescas do mar;
ou caísse de uma outra atmosfera,
ou de outro mundo ou de outro mistério.
Velhos homens do mar nunca a haviam visto nos gelos
nem nenhum andarilho a encontrara jamais:
era antropomorfa como um anjo e silenciosa
como qualquer poeta.
Primeiro pairou na grande cúpula do templo.
mas o pontífice tangeu-a de lá como se tange um demônio doente.
E na mesma noite pousou no cimo do farol;
e o faroleiro tangeu-a: ela podia atrapalhar as naus.
Ninguém lhe ofereceu um pedaço de pão
ou um gesto suave onde se dependurasse.
E alguém disse: “essa ave é uma ave má das que devoram o gado”.
E outro: “essa ave deve ser um demônio faminto”.
E quando as suas asas pairavam espalmadas dando sombra às crianças cansadas,
até a mães jogavam pedras na misteriosa ave perseguida e inquieta.
Talvez houvesse fugido de qualquer pico silencioso entre as nuvens
ou perdesse a companheira abatida de seta.
A ave era antropomorfa como um anjo
e solitária como qualquer poeta.
E parecia querer o convívio dos homens
que a enxotavam como se enxota um demônio doente.
Quando a enchente periódica afogou os trigais, alguém disse:
- A ave trouxe a enchente.
Quando a seca anual assolou os rebanhos, alguém disse:
- A ave comeu os cordeiros
E todas as fontes lhe negando água,
a ave desabou sobre o mundo como um Sansão sem vida.
Então um simples pescador apanhou o cadáver macio e falou:
- Achei o corpo de uma grande ave mansa.
E alguém recordou que a ave levava ovos aos anacoretas.
Um mendigo falou que a ave o abrigara muitas vezes do frio.
E um nu: a ave cedeu as penas para meu gibão.
E o chefe do povo: era o rei das aves, que desconhecemos.
E o filho mais moço do chefe que era sozinho e manso:
- Dá-me as penas para eu escrever a minha vida
tão igual à da ave em quem me vejo
mais do me vejo em ti, meu pai.
mas o pontífice tangeu-a de lá como se tange um demônio doente.
E na mesma noite pousou no cimo do farol;
e o faroleiro tangeu-a: ela podia atrapalhar as naus.
Ninguém lhe ofereceu um pedaço de pão
ou um gesto suave onde se dependurasse.
E alguém disse: “essa ave é uma ave má das que devoram o gado”.
E outro: “essa ave deve ser um demônio faminto”.
E quando as suas asas pairavam espalmadas dando sombra às crianças cansadas,
até a mães jogavam pedras na misteriosa ave perseguida e inquieta.
Talvez houvesse fugido de qualquer pico silencioso entre as nuvens
ou perdesse a companheira abatida de seta.
A ave era antropomorfa como um anjo
e solitária como qualquer poeta.
E parecia querer o convívio dos homens
que a enxotavam como se enxota um demônio doente.
Quando a enchente periódica afogou os trigais, alguém disse:
- A ave trouxe a enchente.
Quando a seca anual assolou os rebanhos, alguém disse:
- A ave comeu os cordeiros
E todas as fontes lhe negando água,
a ave desabou sobre o mundo como um Sansão sem vida.
Então um simples pescador apanhou o cadáver macio e falou:
- Achei o corpo de uma grande ave mansa.
E alguém recordou que a ave levava ovos aos anacoretas.
Um mendigo falou que a ave o abrigara muitas vezes do frio.
E um nu: a ave cedeu as penas para meu gibão.
E o chefe do povo: era o rei das aves, que desconhecemos.
E o filho mais moço do chefe que era sozinho e manso:
- Dá-me as penas para eu escrever a minha vida
tão igual à da ave em quem me vejo
mais do me vejo em ti, meu pai.
(Jorge de Lima )
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