− Coitada da Das Dores, tão boazinha...
Das Dores é isso, só isso − boazinha. Não possui outra qualidade. É feia, é desengonçada, é inelegante, é magérrima, não tem seios, nem cadeiras, nem nenhuma rotundidade posterior; é pobre de bens e de espírito; é filha daquele Joaquim da Venda, ilhéu de burrice ebúrnea − isto é, dura como o marfim. Moça que não tem por onde se lhe pegue fica sendo apenas isso − boazinha.
−Coitada da Das Dores, tão boazinha...
Só tem uma coisa a mais que as outras − cabelos. A fita da sua trança toca-lhe a barra da saia. Em compensação, suas idéias medem-se por fração de milímetro. Tão curtinhas são. Cabelos compridos, idéias curtas − já o dizia Schopenhauer.
A natureza pôs-lhe na cabeça um tablóide homeopático de inteligência, um grânulo de memória, uma pitada de raciocínio − e plantou a cabeleira por cima. Essa mesquinhez por dentro. por fora ornou-lhe a asa do nariz com um grão de ervilha, que ela modestamente denominava verruga, arrebitou-lhe as ventas, rasgou-lhe uma boca de dimensões comprometedoras e deu-lhe uns pés... Nossa Senhora, que pés! E tantas outras pirraças lhe fez que ao vê-la todos dizem comiserados:
− Coitada da Das Dores, tão boazinha...
( Monteiro Lobato)
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